Desde os tempos antigos os homens vêm
buscando compreender o que é o tempo, Santo Agostinho fica intrigado quando não
consegue explicar o que é o tempo, existe essa dificuldade dialética/metafisica
de conceber uma explicação lógica para o tempo. Chegando ao século XVI o tempo
conquista a Europa e se transforma numa das mais importantes categorias de
definição. Portanto, a civilização Ocidental agora tem o fator tempo como uma
categoria que define a identidade da civilização Ocidental (pág.81,82). Em
detrimento a outros povos que não contam o tempo, os europeus não consideram
como civilizados.
Em a mensuração da realidade Crosby
discute a instantânea passagem da percepção qualitativa para a percepção
quantitativa na Europa Ocidental no final da Idade Média e no período da
renascença. Advindos dessas mudanças a ciência moderna se desenvolveu
tecnologicamente, junto com o comercio e a burocracia. Entretanto essas
mudanças não afetaram apenas o evidente, que são as medições do tempo e do
espaço como também os procedimentos matemáticos, mas também de modo igual, afetou
os campos da musica, das artes (Pinturas), mostrando a profundidade das
mudanças ocorridas.
Como podemos perceber, as concepções
ocidentais foram se modificando á medida que modificou a experiência dos
europeus (Pág. 58). A concepção de tempo na Idade Média era canônica, ou seja,
relacionado à tradição e a religião, não havia a necessidade de um tempo exato
em sim (pág. 82).
Para os camponeses os horários estavam
relacionados com clima, nascer e pôr do sol, e era essa percepção que guiava o
tempo do camponês medieval (pág. 82). Já nas cidades as horas tinham uma grande
importância, demonstrando assim a nova concepção de quantificação através da
introdução do elemento comercial, antecedendo até mesmo a compreensão
capitalista que tem o tempo como dinheiro. Nas cidades o relógio era muito mais
do que um elemento decorativo e transcendeu a concepção canônica e qualitativa
para uma concepção quantitativa, satisfazendo assim as atividades comerciais,
como também dava uma vida cronológica aos seus habitantes e visitantes.
Crosby sai à procura de uma explicação
semântica indo beber das concepções de varias línguas ocidentais desde o inglês
ao alemão, chegando à conclusão que o significado da palavra relógio tem o
significado de sino nessas línguas, trazendo consigo o instrumento canônico de
medição do tempo desde a Idade Média a Renascença. Os sinos eram muito
importantes na Idade Média, marcavam o tempo canônico, sem sinos disse
Rebelais, “É como um cego sem bengalas” (pág. 83), a marcação do tempo era
sempre canônica, ou seja, determinavam o tempo das orações, mas sem terem uma
preocupação com a precisão minuciosa.
Para o morador dos burgos o relógio
tinha um valor prático e a introdução da qualificação, todavia isso não
significa que com essa compreensão do tempo qualificado. Fazendo um trocadilho
com a lógica o autor nos diz que “se a história fosse lógica, um astrólogo ou
um monge” teria inventado o relógio mecânico (pág. 83). Os astrólogos tinham a
sua função de definir a posição dos planetas moveis, e o tempo em que nasceriam
ou morreriam os reis, papas e os ricos da sociedade. Já os monges tinha uma
rotina com as matinas de oração e era complicado manter a métrica temporal
exata, sem o relógio mecânico eles mantinham um recurso métrico peculiar.
Nas últimas décadas do século XIII a
Europa Ocidental passou por um período de inventos e avanços tecnológicos, com
intuito de auxiliar as tarefas dos homens e segundo o autor foi em meados de
1270 que o relógio mecânico foi inventado, pois depois em 1300 houve um aumento
de citações em escritos sobre as chamadas maquinas de medir o tempo (pág. 85).
Mudou-se a forma de se conceber o tempo, e nessa evolução dos relógios
mecânicos, os primeiros relógios mecânicos continham apenas sinos, o tempo
qualificado já era uma realidade presente na Europa Ocidental (pág.85). E na
compreensão de muitos o “tempo era um fluxo não fracionário” (pág. 85), e
difícil de medir e de imitar sua passagem continua, e assim muitos inventores
levam séculos tentando fazer essa tarefa. Mas não conseguiram fazer “um modo
prático de medir longos períodos por esses meios”. Quando se parou de pensar o
tempo como um “fluxo continuo” e passou-se a pensar o tempo como uma sucessão
de quantidades, a coisa mudou, entretanto existia um problema, “como assegurar
que a primeira hora assim medida tivesse a mesma duração da última?” em
resposta a essa pergunta foi inventado o escapo, vejamos como funcionar o
escapo:
“A energia da
mola viaja pelos cinco componentes do conjunto de engrenagens, tendo a roda de escape
com sua última peça. A roda de escape trava e libera intermitentemente (e,
consequentemente, trava e libera todo o conjunto de engrenagens, ocasionando a
marcação do tempo), já que a primeira palheta de rubi imobiliza a roda de
escape, a libera, sendo, então, parada pela outra "levée" de rubi. A
roda do balanço (através de um rubi, a "elipse") move a âncora e suas
"levées" para frente e para trás em intervalos regulares. O balanço,
portanto, calcula o movimento da âncora, que trava e libera a roda de escape.
Tudo aquilo é para isto, pelo menos em tese. Aqueles que não desejam detalhes
desta operação não precisam ler adiante.” (ODETS 2013)[1]
Embora a invenção do escapo não tenha
solucionado os mistérios do tempo, ele deu ao homem o poder de domesticar o
tempo. É bem verdade que o relógio mecânico não foi uma propriedade peculiar do
Ocidente, os chineses já possuíam no século x esses gigantescos relógios. Mas
seu aperfeiçoamento e utilização sem dúvidas se mostrou singular no Ocidente
caindo no gosto e transcendeu as horas desiguais pelas horas similares
(pág.87). Neste contexto os primeiros capitalistas perceberiam a necessidade de
horas iguais para assim fazer com que o trabalhador executasse suas atividades
por mais tempo principalmente no inverno. E nesse sentido as horas desiguais
foram substituídas pelas iguais e a partir daqui passaram há pensar o tempo
como homogêneo (pág.87). “Foi nas cidades europeias que pela primeira vez na
historia o tempo foi começou a ser isolado como uma forma pura e externa a
vida” (pág.87).
Segundo o autor os efeitos do relógio
foram múltiplos e imensos, eles exigiam pericia e técnica para o especialista.
Trouxe aos Ocidentais um “novo meio de imaginar ou de meta-imaginar” (pág.88).
A chamada maquina do mundo passara a ser imprescindível a essa civilização. Era
fascinante essa maquina, e durante gerações o relógio da cidade fora o único
mecanismo complexo que milhares de pessoas viram, dias e noites. O relógio
apresentou um ensinamento de que o “tempo, invisível, inaudível, ininterrupto,
era composto de quantidades” (pág.90). Isso explica o fato dos europeus
Ocidentais terem priorizado a medição do tempo em detrimento a reformular seu
calendário. Com a entrada de Deus no tempo encarnado de Cristo, sacralizou
algumas datas, da qual o autor destaca a “Pascoa” que provocou grandes
discussões da exatidão da data. A discrepância do calendário Juliano e a
realidade solar correspondia á 11 dias em 1582 (pág. 92).
O papa Gregório XIII convocou uma
conferencia com especialista para assim reformar o calendário Juliano, passada
essa revisão o novo calendário ficou conhecido como gregoriano. Com efeito,
dessa revisão “a diferença entre o ano abstrato do calendário composto de dias
inteiros e o ano solar real, composto de 365 dias e uma fração” (pág.92). A
reforma do calendário não agradou muita gente, desde católicos fervorosos,
protestantes e filósofos, não concordavam com o papa, principal mentor desta
reforma no calendário Juliano, entretanto diante de uma batalha calorosa, a
reforma gregoriana saiu vitoriosa, mas não pelo fator de ser perfeita, mas
porque era prática (pág.93).
Foi uma mudança de percepção do tempo
foi drástica para os ocidentais, todavia já a percepção do espaço não foi
assim. Em relação ao espaço não ocorreu um salto tecnológico tão grande quanto
na percepção do tempo. Segundo Crosby “a transformação da percepção ocidental
do espaço, culminou em mudanças tão radicais quanto as que abalaram a física no
inicio do século XX, começou como em passo de tartaruga” (pág.99).
Com a invenção da bussola, associada ao
desenvolvimento da cartografia, foi possível aos navegadores arriscarem mais e
a buscarem novos espaços. Os mapas existentes permitiam uma navegação costeira
como no mediterrâneo, para os navegadores oceânicos era necessário possuírem
mapas para assim calcular rotas por todo planeta. Segundo Crosby “o passo
seguinte na cartografia seria tirar da área e da forma, além da direção e da
distancia” (pág.101). O conceito de traçar mapas de conformidade com uma grade
de linhas, já existia tanto na Europa Ocidental, quanto em outras regiões no
inicio do século XIV (pág.101). Com a descoberta de um exemplar da geografia de
Ptolomeu em meados de 1400, provocou uma mudança na percepção espacial
semelhante ao invento do escapo para a percepção do tempo (pág.101).
A contribuição de Ptolomeu consistia em
“tratar a superfície da terra como um espaço neutro, chapando sobre uma grade,
um quadriculado de coordenadas calculadas de acordo com as posições de corpos
celestes” (pág.101). Dando a Europa dos anos 400 três processos diferentes e
matematicamente coesos que davam para representar a superfície curvada da terra
em mapas planos. De acordo com (Falcon 2006) “As várias experiências das
cruzadas e do comercio intercambiaram valores que configuram novos interesses
aceleram a curiosidade dos europeus ainda medievais” (FALCON 2006 p.73)[2]
com os avanços na cartografia e o contato dos europeus ocidentais com outros
povos, e esse choque de culturas proporcionado pelo comércio fez com que o
conhecimento se ampliasse, caindo teorias como o geocentrismo que deu lugar ao
eliocentrismo. Segundo (Silva 1990), “as
grandes descobertas no litoral africano, e com a consciência de que Ptolomeu,
Plinio e os demais sábios estavam errados, pois o mundo não acabava do Cabo
não”. (SILVA 1990, p.24)[3].
Colombo atravessa o Atlântico e chegando
as Américas em 1490 e em 1500, Cabral chega ao Brasil. Crosby nos diz que “A
revolução Copernicana foi imensa, não apenas por seu rebaixamento da terra, mas
também por suas implicações para a quantidade e a qualidade do próprio espaço” (pág.107). Giordano Bruno foi o primeiro pensador de
renome a proclamar a teoria Copernicana e suas implicações, entretanto foi
morto pela inquisição. Sendo o “espaço homogêneo e mensurável a analise
matemática” (pág.108), e, portanto passivo de ser mensurado pelo homem, isso
foi uma grande descoberta que darão suporte para varias outras nos séculos
seguintes.
Por Elson Cassiano
Historiador/UERN
[1] ODETS, Walt. O escapamento de
âncora, (Tradução livre por Flávio Maia), disponível em: http://www.relogiosmecanicos.com.br/escapamento.html Data: 10/02/13.
[2] FALCON, Francisco; RODRIGUES,
Antônio Edmilson. A formação do mundo moderno: a construção do ocidente dos
séculos XIV ao XVIII. 2ª Ed. Rio de janeiro: Campus, 2006. (Cap. 3).
[3] SILVA, Francisco Carlos
Teixeira. Conquista e Colonização da América Portuguesa. In: LINHARES, Maria
Yedda (Org.). História Geral do Brasil. Rio de janeiro: Campus, 1990, pp.15-68.
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