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terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

O comércio e o desenvolvimento das feiras na Idade Média



Este texto faz parte do primeiro capitulo da minha monografia 
O comércio é bastante antigo, desde que o homem vive em sociedade, há indícios de que eles negociavam seus excedentes. O comércio passa a existir, quando se produz além do que se necessita para sobreviver, e desse excedente aparece à necessidade de troca, e com a criação da agricultura e da pecuária há 10 mil anos, passaria a exigir especialização na pré-história. “Os artesões, os cervejeiros, os construtores, padeiros”... Versignassi  (2012), se aglutinava ao redor das maiores fontes de grãos, carne, leite, azeite..., originando as primeiras cidades. E com a especialização desse comércio surgiu o chamado comércio interurbano, entre as Cidades-Estados, internacionalizando-se.
            No trajeto do desenvolvimento do comércio desde a pré-história as primeiras civilizações, adentrando na Idade Média com o advento das feiras. Como podemos observar, o surgimento das feiras se deu através das trocas de mercadorias produzidas pelo individuo por outras mercadorias produzidas por outrem de acordo com a necessidade de cada um.

[...] As feiras são velhas instituições, menos antiga que os mercados (nem sempre), mergulhando no passado de intermináveis raízes. Em França, erradamente ou não, a investigação histórica recua as suas origens para lá de Roma, até a longínqua época das grandes peregrinações célticas. (SILVA 2010) [1]

Segundo Pirenne (1982), no início da Idade Média a Europa se encontrava em estagnação econômica, e um profundo abandono das áreas urbanas, devido às invasões Islâmicas no século VIII, que bloquearam os portos e o comércio urbano das principais cidades da Europa ocidental, dando origem a ruralização e as cidades episcopais e os burgos. Visão essa que será contraposta adiante por Bloch (1939) e Franco Junior (2001). Franco Junior (2001) descreve assim a situação do comércio no inicio da Idade Média: “Uma pequena produtividade agrícola e artesanal, consequentemente uma baixa disponibilidade de bens de consumo e a correspondente retração do comércio e, portanto da economia monetária.” Franco Junior (2001) nos diz também que houvesse o retrocesso demográfico e técnico, que gerou uma economia pouco mecanizada, onde o peso da mão-de-obra fora decisivo para manter a produção, com a redução da força de trabalho, gerou também a contração dos rendimentos que se refletia na pobreza demográfica. A ideia de Pirenne de que a estagnação ou desaparecimento do comércio na Idade Média esteja relacionado diretamente à expansão Islâmica foi equivocada, embora o autor nos mostre que houve certa debilidade urbana em meados do século VIII seguido de lenta recuperação gerada pelo artesanato. Vejamos o que Bloch (1939) irá nos dizer sobre o período, “A Europa da primeira idade feudal não vivia de modo algum concentrada sobre si própria. Existiam várias correntes de trocas, entre ela e as civilizações circundantes.” Bloch (1939) vai dizer que o comércio estava enfraquecido, mas não paralisado ou inerte como sugere Pirenne (1982).

[...] “Pela conhecida e hoje pouco aceita tese de Henri Pirenne, o comércio mediterrâneo manteve-se praticamente inalterado até a época das conquistas muçulmanas. Teriam sido então rompidos os contatos entre Ocidente e Oriente o comércio desaparecido, as cidades decaído e a sociedade ocidental se ruralizado completamente. A síntese dessa nova situação teria sido a perda de importância dos territórios mediterrânicos e o deslocamento do centro de gravidade da Europa para o norte, daí a ascensão de uma família daquela região, os Carolíngios. Na célebre formulação do grande historiador belga, “sem Maomé, Carlos Magno é inconcebível” (PIRENNE: 108).” (PIRENNE 1982 apud FRANCO JUNIOR, 1991 p. 28)[2]


            Embora houvesse essa estagnação das cidades medievais e consequente ruralização, Franco Junior (1991) nos esclarece que as conquistas islâmicas não afetaram as relações entre Ocidente e Oriente, pois havia o domínio Bizantino no mar mediterrâneo.

[...] “Procurando proteger as regiões não ocupadas pelos islamitas, a frota bizantina bloqueou a faixa central daquele mar, isolando sua zona ocidental da oriental. Assim, o tráfico mediterrânico tornou-se intenso no centro, região de relativa segurança, o que beneficiou a península itálica, transformada numa das principais vias de importação de produtos orientais, posição mantida nos séculos seguintes.”  (FRANCO JUNIOR, 1991 p. 28)[3]


Os produtos do comércio oriente-ocidente penetrava a península ibérica espanhola dominada pelos mulçumanos de onde os mercadores iriam busca-las e abasteciam o ocidente. Segundo o autor somente quando em 829 os mulçumanos ocuparam a ilha de Creta, passaram a dominar o mar mediterrâneo e consequentemente se livrou do bloqueio bizantino e o mediterrâneo foi reaberto a navegação, e ressalta que embora o mediterrâneo tenha sido uma zona perigosa o comércio nunca fora interrompido. O comércio acontecia através do tráfico de mercadorias pelo mediterrâneo, contudo devido os altos custos do transporte, tornavam essas mercadorias caras e limitadas como foi caso das mercadorias de luxo, enfraquecendo a balança em relação ao Oriente, tendo basicamente a oferecer escravos, “Dos países do Levante, o Ocidente recebia quase exclusivamente algumas mercadorias de luxo, cujo valor, muito elevado em relação ao seu peso, permitia desprezar as despesas e os riscos do transporte.” (BLOCH, 1939).

[...] “O comércio interno também se viu limitado, mas não paralisado. Se as dificuldades de produção, de um lado, restringiam as trocas por gerar poucos excedentes, de outro lado tornavam necessário que uma região com problemas temporários procurasse determinados produtos básicos em outras. Quando um domínio tinha um certo excedente, ele era comercializado, diante da impossibilidade de se estocar.” (FRANCO JUNIOR, 1991 p. 29)[4]


Conforme o autor, para escoar a produção, que não havia a possibilidade de estocar foi criado às feiras, como a de Saint- Denis no século VII, para vender a produção de vinho e mel. Na Idade Média, houve a necessidade de um intercâmbio de mercadorias e essa foi conforme alguns historiadores a principal causa da origem das feiras. Geralmente, essa pratica era realizada semanalmente próximo aos castelos e mosteiros, surgindo assim os pequenos mercadores sob o controle dos Bispos. Bloch (1939) evita a conceituação de uma economia fechada, existia um mercado e procura de produtos, “Sabemos da existência de mercados onde os camponeses certamente vendiam alguns produtos dos seus campos ou das suas capoeiras: à gente da cidade, aos clérigos, aos homens de armas. Era assim que eles arranjavam os dinheiros dos foros.“ Como mencionado acima era um pequeno comércio baseado na relação troca de mercadorias sem uma moeda e sem a necessidade de produzir um excedente para se negociar. “Só se produzia ou cultivava em excesso, quando havia uma procura por determinados produtos” (HUBERMAN, 1986).

[...] No período feudal, no entanto, houve um declínio no comércio relacionado às feiras, visto que o feudalismo era marcado pela pratica de cultivo para o autoconsumo. As feiras tiveram um papel de destaque somente a partir da revolução comercial, na Idade Média. (TEIXEIRA e COUTINHO 2010).[5]

            Vários problemas além das técnicas agrícolas atrasadas se apresentava que contribuíram para o declínio do comércio e da ruralização feudal na baixa Idade Média, as perturbações sociais, também contribuíram para esse declínio comercial, como também para mostrar que se mantinha vivo no interior do feudalismo o comercio, que Bloch (1939) irá nos dizer que se apresentará em tráficos e trocas de mercadorias, quando por condições de uma má colheita uma região produzia mais que a outra, havia essa ligação comercial entre os feudos.

[...] Quando acontecia que as colheitas não eram produtivas, se muitos, literalmente, morriam de fome, a população inteira não ficava reduzida a tais extremos e sabemos que dos países mais favorecidos para aqueles que eram atingidos pela fome se estabelecia um tráfico de trigo que se prestava a muitas especulações. (BLOCH, 1939 p. 88)[6]

Com a produção do “excedente” havia e necessidade de um espaço físico que “reunisse os produtores para comercializar esse excedente”, trocado por outros produtos do qual não produziam, lentamente essas atividades de trocas foram se desenvolvendo e essas foram às causas principais segundo Pinheiro (2011) da origem da feira livre na Idade Média. Contudo, esse comércio ainda não era significativo, comumente essas praticas eram realizadas semanalmente próximas aos castelos e mosteiros, surgindo assim os pequenos mercadores sob o controle dos Bispos. Como mencionado acima era um pequeno comércio baseado na relação troca de mercadorias sem uma moeda e sem a necessidade de produzir um excedente para se negociar. “Só se produzia ou cultivava em excesso, quando havia uma procura por determinados produtos” (HUBERMAN, 1986).
Havia esse comércio local no mercado, de produtos cotidianos, que na concepção de Huberman (1986) se distingue da feira, que segundo ele, o mercado era um lugar onde se negociava os produtos locais originário das atividades agrícolas, já as feiras era um comércio de proporções maiores, onde se negociava mercadorias vindas de diversas regiões. 

[...] “A feira era o centro distribuidor onde os grandes mercadores, que se diferenciavam dos pequenos revendedores errantes e artesãos locais, compravam e vendiam as mercadorias estrangeiras procedentes do Oriente e Ocidente, Nordeste e Sul”. (HUBERMAN 1986 apud PINHEIRO 2011 p. 22-23)[7]

Outro fator que contribuiu para a essa expansão comercial foi o surgimento das expedições denominadas de cruzadas, que necessitavam de grande contingente de soldados e de recursos para a empreitada, os mercadores se engajavam nas cruzadas em busca de riquezas e novos produtos, saqueando as cidades conquistadas e se apropriando de seus produtos. Essas transformações fizeram com que o comércio se expandisse estabelecendo as grandes rotas comerciais entre oriente e ocidente o que fez com que os mercadores entrassem em contato com novos produtos para serem negociados.
            De acordo com Almeida (2009), com a implantação das feiras fora necessário a criação de regras ou leis que Pirenne (1982) chama de “direitos das feiras” com intervenção direta do Estado, que regulamentava as feiras oficializando-as. Tamanha era a sua importância para as cidades e vilas.

[...] “Atribui-se à Idade Média, a oficialização das feiras, pois em Roma, estabeleceu-se que as regras de criação e funcionamento destas dependiam da intervenção e garantia do Estado, que atuava como disciplinador, fiscalizador e cobrador de impostos.” (ALMEIDA, 2009) [8].

Pirenne (1982) nos diz que o direito tratou ás feiras com privilégio, estabelecendo sua estrutura protegida por uma paz especial, punindo com severidade os mercadores fraudulosos. As autoridades locais garantiam salvo conduto para todas as pessoas que comparecessem as feiras. Segundo Pirenne (1982) havia uma polícia “Guardas das feiras” e “uma jurisdição de exceção os mercadores tinham total apoio das autoridades locais, que garantiam a segurança, isenção de taxas, impostos, e até lugares para os comerciantes estocarem suas mercadorias além de transitarem livremente por todo território.” (PINHEIRO 2011).
Com a evolução do comércio há consequentemente a necessidade de moeda para facilitar as transações, sobre a origem e o uso do dinheiro, Smith (1996) nos diz que todo homem sobrevive por meio da troca e consequentemente se torna comerciante, transformando a sociedade no que ele denomina de sociedade comercial.  As condições para um comércio forte barrava-se nos problemas estruturais das vilas feudais, péssimas estradas, meios de transportes eficientes para longas distâncias, e segurança para os mercadores. Para que se viabilizasse o desenvolvimento do comércio eram necessárias modificações estruturais, políticas, sociais e econômicas. “Outros obstáculos retardavam a marcha do comércio. O dinheiro era escasso e as moedas variavam conforme o lugar. Pesos e medidas também eram variáveis de região para região.” (HUBERMAN 1986)

Por Elson Cassiano
Historiador/UERN


[1] SILVA. Edmilson Menezes da. et al. o desenvolvimento econômico e social da feira livre de Umbaúba, 1989 a 2009. Publicado em 23 de fevereiro de 2010 em História.
[2]FRANCO JÚNIOR, Hilário. A Idade média: nascimento do ocidente, Brasiliense, 2ª ed. São Paulo, 2001 p. 28.
[3] Ibid. p. 29
[4] Ibid. p. 29
[5] Coutinho. Eliane de Castro; Teixeira. Jean Michel Jorge. Feira Livre do Entroncamento em Belém-PA: da precarização à promoção da qualidade ambiental. No. 33 - 03/09/2010
[6] BLOCH. Marc, A sociedade Feudal. Tradução de Emanuel Lourenço Godinho. Revisão de Edições 70 Lisboa Portugal 1939, p. 88.
[7] PINHEIRO, Sirleno Itamar Barbosa. A feira livre do município de Assú/RN: caracterização e análise socioeconômica. Monografia - Universidade do Estado do Rio Grande do Norte – UERN, Assú/RN, 2011, p. 22-23.
[8] ALMEIDA, shirley patrícia nogueira de castro e. Fazendo a feira: Estudo das artes de dizer, nutrir e fazer etnomatemático de feirantes e fregueses da Feira Livre do Bairro Major Prates em Montes Claros – MG, 2009, dissertação de mestrado em desenvolvimento social PPGDS, Universidade Estadual de Montes Claros, UNIMONTES. MONTES CLAROS – MG 2009.
[9] SMITH, Adam. Os economistas, A riqueza das nações, investigação sobre sua natureza e suas causas, Vol. 1, Apresentação de Winston Fritsch Tradução de Luiz João Baraúna Fundador VICTOR CIVITA (1907 - 1990), Editora Nova Cultural Ltda. São Paulo, 1996.
[10] LE GOFF. Jacques. O apogeu da cidade medieval, tradução: Antônio de Padua Danesi, Martins Fontes, São Paulo, 1992.
[11] FRANCO JÚNIOR, Hilário. A Idade Média: nascimento do ocidente, Brasiliense, 2ª ed. São Paulo, 2001.
[12] FALCON, Francisco; Rodrigues, Antônio, Edmilson. A formação do mundo moderno: A construção do ocidente dos séculos XIV ao XVIII, 2 ed. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 2006 p.11.
[13] FRANCO JÚNIOR, Hilário. A Idade média: nascimento do ocidente, Brasiliense, 2ª ed. São Paulo, 2001, p.51.
[14] SWEEZY. Paul, et al. A Transição do feudalismo para o Capitalismo. Tradução de Isabel Didonnet.  Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1977, p.215.

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