O tesouro da humanidade
está na diversidade criadora, mas a fonte da sua criatividade está na sua
unidade geradora. [15]
A capacidade de
produção simbólica, de construção cultural, de pensamento e consciência, de
planejamento da vida, nos distancia dos demais animais. Entretanto, nossa
animalidade também faz parte de nossa constituição, sem ela, não somos, não
existimos. Somos parte da natureza. Morin adverte-nos para o fato de nossa
condição cósmica, física, terrestre e ao mesmo tempo humana [16].
Nossa animalidade é
testemunhada pelo nosso enraizamento no cosmos e nossa humanidade testemunha
nossa possibilidade de alçar vôo e de desenraizarmo-nos. [17]
Somos originários do
cosmos, da natureza, da vida, mas devido à própria humanidade, à nossa cultura,
à nossa mente, à nossa consciência, tornamo-nos estranhos a este cosmos que nos
parece secretamente íntimo. Nosso pensamento e nossa consciência fazem-nos
conhecer o mundo físico e distanciam-nos dele. O próprio fato de considerar
racional e cientificamente o universo separa-nos dele. Desenvolvemo-nos além do
mundo físico e vivo. É neste ‘além’ que tem lugar a plenitude da humanidade.
[18]
No humano do humano,
Morin destaca a unidualidade biológica e cultural e os circuitos [19]: cérebro/mente/cultura
[20], sendo cada um dos termos é necessário ao outro; razão/afeto/pulsão, em que as relações entre
as três instâncias não são apenas complementares, mas também antagônicas; e
indivíduo/sociedade/espécie: “todo desenvolvimento verdadeiramente humano
significa o desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das
participações comunitárias e do sentimento de pertencer à espécie humana” [21].
A visão unilateral que
“define o ser humano pela racionalidade (Homo sapiens), pela técnica (Homo
faber), pelas atividades utilitárias (Homo economicus), pelas necessidades
obrigatórias (Homo prosaicus)” [22] deverá ser abandonada. Caracteres antagonistas
estão presentes no ser humano; o delírio, o jogo, a imaginação e o consumismo
também são partes constitutivas do ser humano. O ser humano é uno e diverso ao
mesmo tempo, em sua individualidade e em sociedade.
Há uma unidade humana;
uma diversidade humana. Há unidade na diversidade humana, diversidade na
unidade humana. A unidade não está somente nos traços biológicos da espécie
homo sapiens. A diversidade não está somente nos traços psicológicos,
culturais, sociais do ser humano. Há também uma diversidade, propriamente
biológica, na unidade humana e uma unidade mental, psíquica, afetiva. Essa
unidade/diversidade vai da autonomia ao mito. [23]
O ser humano não
consegue viver só de racionalidade, autonomamente. Ele carece do afetivo, do
lúdico, do imaginário tal qual é capaz de objetividade e racionalidade, ele é
homo complexus [24]. Entretanto a educação formal, na maioria das vezes,
privilegiou a racionalidade [25] e ignorou as aptidões lúdicas, imaginárias e
míticas no processo de ensino-aprendizagem.
Morin, ao considerar o
aspecto mítico do ser humano, introduz o tema da noosfera que diz respeito ao
“mundo vivo, virtual e imaterial, constituído de informações, representações,
conceitos, ideias, mitos que gozam de uma relativa autonomia e, ao mesmo tempo,
são dependentes de nossas mentes e de nossa cultura” [26]. Mitos e ideias
originam-se em nossas mentes e ganham consistência e poder, “não somos apenas
possuidores de ideias, somos também possuídos por elas, capazes de morrer ou
matar por uma ideia” [27]. Na verdade, Morin entende que “somos os criadores e
criaturas do reino do mito, da razão, da técnica, da magia” [28].
À educação cabe ajudar
as mentes a se movimentarem na noosfera, entendendo que mitos e ideias são
meios de comunicação, mas também podem tornar-se meios de ocultação.
No ser humano, “o
desenvolvimento do conhecimento racional-empírico, técnico jamais anulou o
conhecimento simbólico, mítico, mágico ou poético” [29]. O estudo da
complexidade humana será uma das vocações da educação do século XXI, sendo
necessária e urgente “a re-ligação dos saberes”.
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